sexta-feira, 21 de maio de 2010

Glossário

Acção - Processo de desenvolvimento de acontecimentos singulares (determinados pela evolução das atitudes ou dos caracteres), podendo conduzir ou não a um desenlace. Porque a acção é um elemento dinâmico, só pode ser entendida de modo evolutivo e situada no tempo e no espaço.

Acção principal - Conjunto dos momentos fulcrais da história que garantem a sua progressão numa ou noutra direcção, de tal modo que a supressão de um deles põe em causa a coerência da própria história.

Acção secundária - Evento que está relacionado com o acontecimento principal que se desenrola paralelamente à acção central e que mantém em relação a ela uma posição de subalternidade, cabendo ao narrador estabelecer essa relação hierárquica.

Antagonista – personagem que, num texto narrativo ou dramático, se opõe a outra, normalmente ao protagonista ou herói.

Autor - Pessoa real responsável pela concepção da obra literária.

Caracterização directa - Descrição explícita dos atributos das personagens, que pode ser feita por várias instâncias narrativas: a própria personagem, outra personagem ou o narrador.

Caracterização indirecta - Ausência de descrição explícita dos atributos das personagens, sendo a sua caracterização deduzida a partir dos seus comportamentos ou linguagem.

Conto - Género narrativo em prosa caracterizado por uma extensão reduzida, poucas personagens e concentração espácio-temporal. A acção é linear, circunscrevendo-se a um conflito, a um episódio ou a um acontecimento insólito, por vezes aparentemente insignificante.

Conto popular - Conto de autor anónimo que faz parte da literatura tradicional de transmissão oral, circulando de geração em geração.

Descrição - Fragmento discursivo portador de informação sobre as personagens, os objectos, os lugares, o tempo, facilmente destacável do conjunto textual. Essencialmente estático, constitui momento de pausa na progressão linear dos eventos e, quando suprimido, não compromete a coerência interna da história. A acção sofre um corte na sua dinâmica para se fixar num imobilismo não sujeito a uma ordenação cronológica.

A descrição implica frequentemente alterações ao nível do discurso:

- A passagem do presente ao imperfeito;

- O emprego frequente de verbos de estado;

- Por vezes, a estruturação do espaço em torno de uma personagem ou vice-versa;

A descrição contribui para a delimitação de subgéneros da narrativa: no romance histórico e nas narrativas de descrição, assume particular relevo a descrição do espaço; no romance psicológico, a descrição da personagem.

Diálogo - Forma de discurso e modo de expressão literário em que o "emissor" e o "receptor" se alternam na comunicação das respectivas mensagens. Surge nos textos narrativos, nos dramáticos e, por vezes, nos líricos. Encontra-se estreitamente relacionado com o discurso da personagem e com o conceito de cena. A reprodução fiel do diálogo entre as personagens (estratégia de representação próxima da representação dramática) implica a utilização do discurso directo - tentativa de aproximação máxima, no plano do discurso, da duração dos acontecimentos narrados - e o apagamento do narrador que dá a palavra às personagens, embora lhe caiba ainda o papel de organizador da narrativa; é o narrador quem decide da sua instauração ou interrupção em função de economia da narrativa. O discurso directo apresenta registos de língua diversificados (traços idiolectais, sociolectais e dialectais) que contribuem para a caracterização da personagem que o profere.

Discurso indirecto livre - Expressão que designa o discurso semi-directo em que o emissor, para dar maior vivacidade à sua comunicação, suprime geralmente o verbo e o conector próprios do discurso indirecto, misturando assim a voz do narrador com a da personagem em causa, como se ambos falassem em uníssono. É uma espécie de voz dual em que se preserva, até certo ponto, a expressividade do discurso directo (observe-se, por exemplo, que nele se conservam sem modificação os deícticos espaciais e temporais do discurso directo).

Espaço - Os componentes físicos que servem de cenário ao desenrolar da acção e à movimentação das personagens; em segunda instância, o conceito de espaço pode ser entendido em sentido mais lato, compreendendo quer atmosferas sociais (espaço social) quer psicológicas (espaço psicológico).

Estrutura Externa – refere-se à “forma” do texto literário, à disposição gráfica e aos níveis fonéticos, morfológico e sintáctico. Designa também a divisão formal de um texto.

Estrutura Interna – refere-se ao conteúdo do texto, aos elementos intrínsecos geradores de sentido (s) ou ainda à divisão de um texto em partes lógicas.

Fábula - Em sentido lato, a história ficcional que se narra ou representa. Em sentido restrito, uma narrativa, em verso ou em prosa, em que as personagens são em geral animais e cuja história encerra, de modo explícito ou implícito, um ensinamento moral.

Linguagem literária - De um modo geral, qualquer manifestação literária distingue-se pela utilização de uma linguagem construída fundamentalmente com uma preocupação estética. A produção desse tipo de linguagem pretende captar a adesão do destinatário para a sua própria mensagem criando uma realidade própria, independentemente da realidade exterior da obra.

Modos literários - Categorias meta - históricas e universais (narrativa, lírica e drama) cujas constantes são historicamente actualizadas nos géneros.

Narração - Processo de enunciação que consiste no "acto narrativo produtor", no discurso do narrador. A narração caracteriza-se pelo dinamismo, dado o relevo aí assumido pela acção (por oposição ao estatismo da descrição), ou seja, pela sucessão encadeada de acontecimentos susceptíveis de serem temporalmente referenciados. As acções evocadas apresentam o cunho da instantaneidade, traduzida pelo emprego do pretérito perfeito ou formas afins, como o chamado presente histórico ou o mais-que-perfeito, deícticos e verbos de acção. É preciso distinguir a narração da história e a história narrada (a "história" ou conteúdo narrativo), o que implica a distinção entre o tempo do discurso e o tempo da história (cf. TEMPO DO DISCURSO e TEMPO DA HISTÓRIA).

Narração é também entendida como um procedimento oposto à descrição ou ainda como modelo literário que se distingue do modo dramático e do lírico.

Narrador - Ser virtual criado pelo autor a quem cabe a tarefa de enunciar o discurso narrativo, organizar o modo de narrar e decidir do ponto de vista a adoptar; é ao narrador que cabe a configuração do universo diegético. Quanto à presença, o narrador classifica-se como:

Autodiegético - narrador coincidente com o protagonista ou o herói;

Heterodiegético - o narrador não participa como personagem na história narrada;

Homodiegético - o narrador participa na história narrada, mas não como protagonista.

Narratário - Termo introduzido na narratologia para designar a instância ficcional, inscrita no texto, à qual é endereçado o discurso produzido pelo narrador.

Narrativa aberta - O leitor não fica a conhecer o destino definitivo das personagens ou o epílogo do romance.

Narrativa fechada - O leitor fica a conhecer a sorte final de todas as personagens e as derradeiras consequências da diegese romanesca. Isto é, a diegese é claramente delimitada com um princípio, meio e fim.

Ordenação da narrativa - caracteriza-se por uma situação inicial, um desenvolvimento ou conflito e por uma conclusão ou desenlace:

Situação inicial - primeira parte de uma intriga (narrativa ou dramática) na qual se expõem as linhas gerais do tema ou argumento;

Desenvolvimento - elemento essencial da acção narrativa ou dramática. O conflito que divide as personagens pode ser físico ou cósmico (Homem/Natureza); psicológico (Razão/Paixão); económico-social (Riqueza/Pobreza); político (Poder/Resistência); moral (Bem/Mal); religioso (Fé/Razão);

Conclusão - a parte final de uma narrativa na qual se solucionam os conflitos. Em certas narrativas modernas não existe conclusão, deixando-se ao leitor a possibilidade de colaborar com o narrador na continuação da história narrada (cf. NARRATIVA ABERTA).

Personagem - Ser ficcional que habita o mundo do texto narrativo ou do texto dramático e que com os seus sentimentos, a sua maneira de ser, a sua ideologia, as suas palavras e os seus actos enforma a história narrada. A personagem tem em geral um nome - e é identificada muitas vezes por um retrato físico e por um retrato psicológico-moral. É sobretudo mediante a personagem, as suas falas, directa ou indirectamente reproduzidas pelo narrador, os seus comportamentos e os seus actos que se manifestam no texto narrativo e no texto dramático valores éticos e posições ideológicas. Uma personagem pode ser estática, se não se transforma ao longo da acção, e dinâmica, no caso contrário. A personagem pode ser plana, se é construída com base num número reduzido de atributos, sem profundidade nem complexidade; pode ser redonda, no caso contrário.

A personagem plana representa com frequência um tipo humano, no plano psicológico-moral e sociológico (o avarento, o cobarde, etc.). A personagem pode ainda definir-se em termos de relevo que determina a sua importância na economia da intriga. Assim, temos: personagem principal - o herói ou protagonista - e as personagens secundárias e figurantes.

terça-feira, 11 de maio de 2010

Conto de Autor


Excerto de “O tesouro” de Eça de Queiróz

Agora eram dele, só dele, as três chaves do cofre!... E Rui, alargando os braços, respirou deliciosamente. Mal a noite descesse, com o ouro metido nos alforges, guiando a fila das éguas pelos trilhos da serra, subiria a Medranhos e enterraria na adega o seu tesouro! E quando ali na fonte, e além rente aos silvados, só restassem, sob as neves de Dezembro, alguns ossos sem nome, ele seria o magnífico senhor de Medranhos, e na capela nova do solar renascido mandaria dizer missas ricas pelos seus dois irmãos mortos... Mortos como? Como devem morrer os de Medranhos - a pelejar contra o Turco!
Abriu as três fechaduras, apanhou um punhado de dobrões, que fez retinir sobre as pedras. Que puro ouro, de fino quilate! E era o seu ouro! Depois foi examinar a capacidade dos alforges - e encontrando as duas garrafas de vinho, e um gordo capão assado, sentiu uma imensa fome. Desde a véspera só comera uma lasca de peixe seco. E há quanto tempo não provava capão!
Com que delícia se sentou na relva, com as pernas abertas, e entre elas a ave loura, que rescendia, e o vinho cor de âmbar! Ah! Guanes fora bom mordomo - nem esquecera azeitonas. Mas porque trouxera ele, para três convivas, só duas garrafas? Rasgou uma asa do capão: devorava a grandes dentadas. A tarde descia, pensativa e doce, com nuvenzinhas cor-de-rosa. Para além, na vereda, um bando de corvos grasnava. As éguas fartas dormitavam, com o focinho pendido. E a fonte cantava, lavando o morto.
Rui ergueu à luz a garrafa de vinho. Com aquela cor velha e quente, não teria custado menos de três maravedis. E pondo o gargalo à boca, bebeu em sorvos lentos, que lhe faziam ondular o pescoço peludo. Oh vinho bendito, que tão prontamente aquecia o sangue! Atirou a garrafa vazia - destapou outra. Mas, como era avisado, não bebeu, porque a jornada para a serra, com o tesouro, requeria firmeza e acerto. Estendido sobre o cotovelo, descansando, pensava em Medranhos coberto de telha nova, nas altas chamas da lareira por noites de neve, e o seu leito com brocados, onde teria sempre mulheres.
- De repente, tomado de uma ansiedade, teve pressa de carregar os alforges.

Conto Popular



Príncipe Sapo

Era uma vez um Rei que tinha sete filhas. A mais nova era a mais bonita. Nos dias de sol a princesa saia para brincar com a sua bola de ouro junto do castelo. Certo dia, ao atirar ao ar a sua bola esta caiu dentro da água e afundou-se. A menina ficou triste. Mas apareceu um sapo que disse-lhe que podia ir buscar a bola se ela prometesse ser amiga dele e partilhar com ele as suas refeições e cama. A princesa desesperada disse que sim. Assim, o sapo mergulhou e foi buscar a bola de ouro. A princesa ficou tão contente quando viu a bola que agarrou nela e saiu correndo sem agradecer. Nessa noite quando estava toda a família reunida para jantar, ouviu-se um coaxar junto à porta do castelo. O Rei intrigado perguntou à sua filha o que se passava e ela contou tudo o que tinha acontecido. Fazendo-a cumprir a promessa, o Rei foi conhecer o sapo. A princesa não queria que o sapo comesse da comida dela, nem que ele dormisse na mesma cama, mas não teve alternativa, o seu pai autorizou o sapo a ficar. Depois do jantar a princesa tentou escapar para o quarto, mas o rei lembrou-a da promessa que tinha feito e ela contrariada obedeceu. No quarto, a princesa pôs o sapo a um canto e ele pediu-lhe para ir para a sua almofada. Quase a chorar, a princesa agarrou no sapo o colocou-o em cima da almofada. Nesse preciso momento, o pequeno sapo verde transformou-se num príncipe belo e sorridente. Explicou à princesa que tinha sido enfeitiçado por uma bruxa e só uma bondosa princesa podia quebrar o feitiço. A partir daquele momento, o príncipe e a princesa tornaram-se os melhores amigos do mundo e anos mais tarde casaram-se e não esqueceram de convidar os seus amigos verdes muito especiais para a festa.

Funcionamento da Língua I